Estudo aponta riscos de tecnologias de reconhecimento facial

Brasil tem ao 376 projetos ativos, capazes de vigiar 40% da população

Um relatório inédito da Defensoria Pública da União (DPU), em parceria com o Centro de Estudos de Segurança e Cidadania (CESeC), da Universidade Candido Mendes (RJ), alerta para o avanço acelerado e desregulado do reconhecimento facial no Brasil. Intitulado Mapeando a Vigilância Biométrica, o estudo mostra que, até abril de 2025, o país contava com ao menos 376 projetos ativos de reconhecimento facial, com potencial de vigiar quase 83 milhões de pessoas — o equivalente à cerca de 40% da população brasileira.

A popularização dessas tecnologias no setor público se intensificou após a realização da Copa do Mundo de 2014 e os Jogos Olímpicos de 2016. Desde então, municípios, estados e órgãos de segurança vêm adotando sistemas de reconhecimento facial com a justificativa de ampliar a segurança, identificar foragidos e localizar pessoas desaparecidas.

No entanto, a pesquisa revela que esse avanço ocorreu sem leis específicas, sem controle externo adequado e com risco real de violações de direitos. Ao todo, os projetos já movimentaram ao menos R$ 160 milhões em investimentos públicos, com dados obtidos em 23 das 27 unidades federativas — Amazonas, Maranhão, Paraíba e Sergipe não responderam ao levantamento feito entre julho e dezembro de 2024.

Erros e racismo algorítmico

Entre os pontos mais críticos, o relatório destaca o número de erros cometidos pelos sistemas. Foram mapeados 24 casos entre 2019 e abril de 2025 nos quais a tecnologia falhou ao identificar corretamente os rostos capturados pelas câmeras. O caso mais emblemático ocorreu em Aracaju, em 2024, quando o personal trainer João Antônio Trindade Bastos, de 23 anos, foi confundido com um foragido e detido durante um jogo de futebol. Bastos, que é negro, foi revistado e interrogado antes de ser liberado, após confirmar sua identidade.

“O reconhecimento facial tem sido amplamente utilizado sem garantir mecanismos que evitem erros graves como prisões injustas”, alerta o relatório, que também aponta para a maior taxa de erro dos sistemas em relação a pessoas negras, indígenas e asiáticas. 

Estudos internacionais mostram que as falhas podem ser de 10 a 100 vezes maiores para esses grupos, em comparação com pessoas brancas.

Falta de regulamentação

Apesar do uso crescente da tecnologia, o Brasil ainda não possui uma legislação específica que regule o uso do reconhecimento facial por órgãos públicos. 

Em dezembro de 2024, o Senado aprovou o Projeto de Lei nº 2338/2023, que trata da regulamentação da inteligência artificial. O texto prevê restrições ao uso do reconhecimento facial em espaços públicos, mas abre exceções tão amplas — como em casos de investigação, flagrante, desaparecimento ou recaptura de foragidos — que, na prática, funciona como uma autorização irrestrita.

“O projeto, como está, legaliza a vigilância em larga escala, sem garantias reais de controle”, alertam os especialistas da DPU e do CESeC. Segundo eles, o risco é que o país consolide um sistema de vigilância permanente, com pouco ou nenhum controle social.

Recomendações e alertas

Diante do cenário, o relatório propõe medidas urgentes, como a aprovação de uma lei nacional para regulamentar a vigilância biométrica; a padronização de protocolos; auditorias independentes; transparência nos contratos; e autorização judicial obrigatória para uso das imagens em investigações. Os pesquisadores também defendem a limitação temporal para armazenamento dos dados e o fortalecimento dos mecanismos de fiscalização sobre empresas privadas envolvidas nesses projetos.

“Esperamos que esses achados possam não só orientar a tramitação do PL 2338 na Câmara dos Deputados, mas também servir de alerta para os órgãos reguladores e de controle. O relatório evidencia tanto os vieses raciais no uso da tecnologia quanto o mau uso de recursos públicos”, afirma Pablo Nunes, coordenador-geral do CESeC.

O debate sobre reconhecimento facial, segundo os autores, não é apenas técnico, mas também ético, social e político. Em um país com histórico de desigualdade racial e falhas sistêmicas na segurança pública, os erros de uma tecnologia sem regulação podem custar caro — especialmente para os que sempre foram mais vigiados.

Fonte: Diário da Guanabara | Reprodução

https://dgrj.com.br/brasil/estudo-aponta-riscos-de-tecnologias-de-reconhecimento-facial

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